Ele foi ministro do Trabalho, da Justiça, e interventor em Pernambuco
Nem 1937, Getúlio Vargas era o presidente provisório do Brasil, posto que deveria ocupar até o ano seguinte, quando haveria eleições. Mas, como a turbulência política era grande, então, ele aproveitou-se dela para dar um golpe e implantar o “Estado Novo” — uma ditadura que, sob vários aspectos, se assemelhava ao regime fascista de Benito Mussolini, na Itália.
Já o pernambucano Agamenon Magalhães, que era seu braço direito, ocupando dois ministérios, voltou para sua terra como interventor. E pôs em prática, aqui, um estilo de governo tão próprio que foi chamado de “agamenonismo”…
RÁPIDA ASCENSÃO
Agamenon Sérgio de Godoy Magalhães nasceu em 1893, em Serra Talhada, no sertão pernambucano, numa família de políticos. Foi promotor público e professor de Geografia até se eleger deputado estadual, em 1924; e, em seguida, federal, pelo Partido Republicano Democrata, que era governista. Em 1929, porém, foi para a oposição, aderindo à Aliança Liberal.
Formada por operários, militares e intelectuais de classe média, além de alguns dissidentes das elites, aquela organização pretendia transformar um país arcaico, controlado pelos fazendeiros de café e submisso aos interesses estrangeiros, num país moderno, industrializado e autônomo. E tendo sido derrotada nas eleições presidenciais de 1929, quando lançou o gaúcho Getúlio Vargas contra o paulista Júlio Prestes, chegou ao poder pelas armas na Revolução 1930, pondo fim à “República Velha”, proclamada em 1889.
Agamenon elegeu-se, então, deputado por Pernambuco à Assembleia Nacional Constituinte, convocada em 1933. Já no ano seguinte assumiu o comando do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, tão importante que foi chamado por Lindolfo Collor, o primeiro titular da pasta, de “o Ministério da Revolução”. E em 1937 acumulou, ainda, o posto de ministro da Justiça, tornando-se o segundo homem mais poderoso do Brasil.
MODELO VARGUISTA
O “nacionalismo econômico” varguista, também defendido por Agamenon, propunha a modernização do País através de uma forte intervenção governamental. Mas, para pô-lo em prática, era preciso tanto o apoio da burguesia quanto da classe operária. E para conquistar os trabalhadores Vargas lhes concedeu direitos que nunca tiveram antes, como carteira profissional, regulamentação das jornadas de trabalho, regulamentação do emprego das mulheres e dos menores etc. etc. Também criou os ministérios da Educação e a Saúde, a Justiça Eleitoral, o voto secreto e o voto das mulheres, por tudo isso ganhando o apelido de “Pai dos Pobres”. Em troca, exigiu que os sindicatos se submetessem ao controle do Estado, tal como na Itália fascista, além de reprimir duramente a oposição.
Esse modelo, é claro, não agradava aos comunistas nem aos democratas em geral. E eles se organizaram numa frente popular — a Aliança Libertadora Nacional — que fez uma tentativa fracassada de assalto ao poder pelas armas, em 1935.
A “Intentona Comunista”, como aquela ação foi apelidada, serviu para Vargas aumentar ainda mais a repressão. Mesmo assim, temendo ser derrotado nas eleições de 1938, ele mandou espalhar que os vermelhos estariam pondo em prática um plano chamado “Cohen”, visando a implantação do socialismo no Brasil. E com essa desculpa esfarrapada, deu o golpe.
No dia 10 de novembro de 1937, o gaúcho anunciou pelo rádio que estava promulgando uma nova constituição. Encomendada ao jurista Francisco Campos, o “Chico Ciência”, essa carta — logo apelidada de “polaca” — determinava a extinção da Justiça Eleitoral, dos partidos políticos, e estabelecia eleições indiretas para a Presidência da República, com mandatos de seis anos.
Agamenon, fiel seguidor de Vargas, foi nomeado, então, interventor em Pernambuco, substituindo um antigo aliado, o governador Carlos Lima Cavalcanti, que vinha flertando com a oposição. Ele voltou à sua terra anunciando que trazia consigo “a emoção do Estado Novo” — ou seja, o espírito do regime autoritário recém-implantado. E falava a verdade.
O “agamenonismo” foi uma cópia regional do populismo varguista, buscando uma falsa paz social e a unanimidade a qualquer custo. Para isso, o interventor não economizou na repressão aos adversários, assim como na perseguição às prostitutas, aos homossexuais, às religiões afro-brasileiras etc. E ainda caprichou no culto à sua própria figura, tal como seu líder se fazia cultuar, nacionalmente. Mas também combateu o cangaço, fez obras contra as secas e construiu moradias populares, beneficiando as populações mais pobres.
Aí, veio a Segunda Guerra Mundial, na qual o Brasil se aliou aos Estados Unidos. E o Estado Novo não resistiu à derrota do nazifacismo na Europa.
Duas leis históricas com seu nome e apelido
Em janeiro de 1945, o pernambucano foi novamente convocado por Vargas para o Ministério da Justiça — mas, desta vez, para democratizar o País, não para implantar uma ditadura, como em 1937. E ele re-estabeleceu as eleições diretas para a presidência — com participação, inclusive, do Partido Comunista —, através da chamada “Lei Agamenon”.
Paralelamente, criou uma legislação “antitruste”, regulamentando as operações das grandes empresas e do capital internacional no Brasil, que não foi tão bem recebida quanto a primeira.
Apelidada pelo jornalista Assis Chateaubriand de “Lei Malaia”, em referência ao apelido de “China Gordo”, que Agamenon ganhara em Pernambuco, ela mexia com interesses muito poderosos e provocou uma enorme reação, apressando a saída de Vargas, em outubro de 1945.
A carreira política do “China”, porém, foi em frente. Ele se passou a chefiar a seção pernambucana do Partido Social Democrático (PSD), criado por Vargas, em 1945. Por essa agremiação elegeu-se deputado à nova assembleia constituinte, convocada naquele ano, alinhando-se entre os defensores da intervenção estatal na economia. E para o governo de Pernambuco lançou a candidatura de Barbosa Lima Sobrinho, também vitoriosa, numa eleição disputada ao modo da “República Velha”, ou seja, com muitas fraudes e violência.
Em 1950, porém, a criatura rebelou-se contra o criador. Getúlio Vargas saiu candidato à presidência pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), mas Agamenon apoiou Cristiano Machado, do seu PSD. E lançou sua própria candidatura ao governo estadual contra João Cleofas, da União Democrática Nacional (UDN), apoiado por Vargas.
No Brasil, ganhou o “Pai dos Pobres”. Mas em Pernambuco deu o “China Gordo”.
O mandato de Agamenon como governador democraticamente eleito, porém, durou pouco. Ele morreu subitamente no dia 24 de agosto de 1952 — a mesma data fatídica na qual Vargas se suicidaria, dois anos depois. E hoje dá nome a um hospital público no Recife e a uma importante avenida que liga esta cidade a Olinda, além de outras vias pelo País afora.
Na próxima semana, Gilberto Freyre.
Trabalhismo
Até 1930, as reivindicações dos trabalhadores eram ignoradas ou respondidas à bala por governos e patrões. Vargas, porém, lhes concedeu muitos benefícios, fazendo dos sindicatos, em troca, “correias de transmissão” do seu governo. Como ministro do Trabalho, Agamenon promoveu intervenções em vários deles, mas fiscalizou o cumprimento das novas leis, criou o seguro por acidente de trabalho, a indenização por demissão sem justa causa, e acelerou a criação dos Institutos de Aposentadoria e Pensões. A CLT, decretada por Vargas no dia 1º de maio de 1943, “consolidaria” essas conquistas.
A Lei Malaia
Promulgada em junho de 1945, essa lei visava reprimir abusos do poder econômico estabelecendo regras para fusões e aquisições em setores como o bancário, elétrico e das comunicações. Também criava a Comissão Administrativa de Defesa Econômica (Cade), e foi violentamente atacada pelos sindicatos patronais do comércio, da indústria e da agropecuária. Os Estados Unidos também se queixaram de discriminação contra empresas estrangeiras e a imprensa caiu de pau sobre ela. O Diário de Pernambuco, por exemplo — que pertencia, então, a Assis Chateubriand —, classificou-a de “nazista” e contrária à propriedade privada; e a “Malaia” foi, de fato, mais uma lei imposta “na marra” pelo Estado Novo. Por outro lado, cumpriu um papel fundamental, colocando o problema dos “trustes” e dos “cartéis” em debate no País.